segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O encontro com Deus prescinde da nossa verdade sobre Ele

Paulo Silvano

O encontro com Deus é desconcertante e prescinde da nossa verdade acerca dEle. Os componentes da ambiência desse encontro apresentam-se cercados pela irracionalidade, enquanto indefiníveis e inacessíveis. Contudo, à medida que nos distanciamos desse momento arrebatador, do NUMINOSO, que se vai com o seu caráter espontâneo, embrenhamos no desvelo do mistério que cerca o encontro; nos ocupamos na construção de um outro equilíbrio.

O descobrimento do majestoso produz, à medida que patenteia o bruxulear da chama do tremendo, abafada pela racionalidade, aquilo que chamamos verdade.

Fundamentamos mais verdades enquanto vamos nos desconectando do numinoso. A transição do numinoso para a conceituação é desvantajosa, pois quanto mais nos apropriamos das verdades menos nos é dado perceber da beleza existente na relação com o Caminho, com a Verdade e com a Vida. Isso até que, desobscurecidos, nos rendamos ao fascínio de um novo encontro.

Imagem em: imagensbiblicas.wordpress.com/

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Transcender: um exercício de liberdade



Alex Carrari


Somos seres de projeção. Ir além é nosso anseio mais primordial e nossa constituição de base. Como seres de projeção é que nos damos conta que existimos (ex), reagimos ao mundo circundante, construímos nosso ser em constante abertura. Assim, dizemos ex-istência, projetar-se para fora. O protesto aí se instaura. Existir é protestar sempre. Protestamos contra os enquadramentos sociais que nos são impostos. Rebelamo-nos contra as repressões eclesiásticas que nos querem tolher a capacidade de pensamento crítico. Insurgimos contra as interpretações dogmáticas castradoras da vida. Rompemos interditos que limitam nossa liberdade e empenho em transformar a realidade.


Protestamos, pois sabemos que somos mais. Nos sentimos mais. Sentir-se mais é afirmar a transcendência como dimensão intrínseca do ser humano. Nosso legado religioso tem de ser submetido à critica quando falamos em transcendência, pois, nossa percepção foi treinada para fazer um corte radical entre imanência e transcendência. Assim, nos disseram que o Céu é para cima , lugar onde Deus habita, os anjos circulam e os santos descansam. Aqui, no chão, no nível mais baixo, fica a imanência onde constatamos uma realidade hostil e inferior. Dois mundos que se contrapõem, mas que pela mecânica da oração e meditação, dizem, pontes são criadas que nos permite vislumbrar a transcendência; processo devidamente mediado pelas religiões.


Embora bela, essa estruturação não condiz com a realidade. Tudo é metafísica. Tudo é uma representação posterior à experiência do ser humano como ser histórico, seja, a experiência originária. São modelos de representação do mundo forjados por nossos ancestrais que já sentiam a perda da unidade entre si mesmos e o mundo sensível.


Céu/inferno, lá/aqui, corpo/alma, Deus/mundo, imanência/transcendência, tudo é metafísica. Nossa experiência originária, aquela situada no grau zero da existência, nos revela que imanência e transcendência não são aspectos distintos, mas dimensões de uma única e mesma realidade que somos nós. Enraizados, situados, porém abertos. Sonhamos para além daquilo que nos é dado como definitivo. Transcender não é um lugar a que se chega, antes, é aceitar o convite do Criador a gerar utopias, criar com Ele possibilidades que viabilizem a vida . Longe do consolo anestésico que as religiões oferecem, transcender é nosso desafio mais secreto, é nossa condição como seres nunca prontos, posto que o ser humano é um projeto infinito, que se realiza no ato supremo da liberdade divina outorgada a nós.